28 outubro 2010

Implicações clínicas dos estudos sobre pós contenção da Universidade de Washington

Ricardo Nader

Clinical Implications of the University of Washington Post-Retention Studies


Este foi um estudo de mais de três décadas realizado por Dr. Robert Little em aproximadamente 900 casos acompanhados por um longo período após a finalização dos tratamentos. Os achados do Dr. Little têm mudado a forma como os ortodontistas lidam com a recindiva do apinhamento e como eles alertam os seus pacientes após o tratamento.
Neste artigo o Dr. Robert Little foca nas lições que tirou do estudo, fornecendo dicas clínicas para o ortodontista.

Lição número 1: Nós sabemos muito pouco ( tradução livre do original: There is so much that we don’t know).

Não é possível saber a natureza nem extensão da recindiva antes do tratamento, no  início do período da contenção e nem durante a contenção. Determinar o prognóstico da recindiva é um dilema. Por exemplo, apenas aproximadamente um terço dos casos de apinhamentos tratados com extrações de pré-molares permaneceram com alinhamento aceitável após o período de dez anos após contenção. Após 20 anos, apenas 10% dos casos permaneceram aceitáveis. Não somos capazes de determinar qual paciente será o futuro vencedor ou qual será o perdedor com o avanço do tratamento, no final do tratamento ativo, ou após vários anos de contenção.
Por exemplo, um caso de apinhamento pode se comportar bem após a contenção. Enquanto outro, apenas moderadamente apinhado, pode apresentar um surpreendente grau de recindiva. Nossa capacidade de prever é bastante pobre.
Implicação clínica: Planeje contenção permanente

Lição 2: Expanda o arco mandibular e assuma os riscos.

Devemos esperar que praticamente todos os nossos casos diminuição das suas dimensões após a contenção. Mesmo os com diastemas, os que estavam com espaços adequados e os apinhados no início do tratamento. A diminuição do comprimento e da largura do arco mandibular é quase uma norma. Expandir estas dimensões durante o tratamento parece exagerar a resposta da recindiva. Manter estas dimensões durante o tratamento pode ser prudente e possibilita a obtenção de melhores resultados, mas mesmo esta estratégia não é garantia de estabilidade. Também encontramos exemplos surpreendentes de considerável recindiva em casos onde as mudanças foram mínimas.
Tipicamente, o casos que sofreram as maiores mudanças foram os que mais recidivaram, a tendência é uma constrição do arco com o tempo, mas não podemos prever o grau desta movimentação.
Implicações clínicas: Evite o aumento do comprimento e da largura do arco mandibular e planeje contenções permanentes.

 

Lição 3: Alguns são os escolhidos

Podemos ser mais otimistas com os casos com espaços generalizados ou com bom alinhamento no início do tratamento. Uma pequena porcentagem destes casos mostrou graus variáveis de apinhamento no futuro, moderado na maioria das vezes. Felizmente aqueles com apinhamento severo foram raros. O autor se sente confortável ao manter as contenções nestes pacientes por alguns anos e possívelmente removê-las no futuro. Mas ele ainda alerta os pacientes para a possibilidade de recindiva e que ele retorne se alguma alteração for notada.
Implicações clínicas: Espere recindiva mínima nos casos com comprimento do arco adequado ou com excesso no início do tratamento.

Lição 4: A estabilidade que ocorre inicialmente é uma miragem

Muitos casos são estáveis por vários anos após a remoção da contenção – o que chamamos de período de “Lua de mel”. Entre o final da infância até os 20 anos de idade os casos tendem a sofrer constrição e apinhar em graus variáveis. Podemos ser enganados pela estabilidade que ocorre nos primeiros anos após a contenção com a recindiva ocorrendo mais severamente numa idade mais avançada. A partir dos 30 anos, o processo constritivo parece diminuir, mas a tendência a constrição gradual continua com a idade não parece ter nenhuma idade que o processo pareça parar de vez. A idéia de equilibrio e estabilidade parece ser mais uma esperança e mito do que uma realidade.
Implicações clínicas: Contenção permanente é o único meio de garantir a estabilidade do alinhamento mandibular.

Lição 5: Dentes com giroversão tendem a recindivar, usualmente para a sua posição inicial.


A maioria das recindivas de giroversão são no sentido da posição original, algumas vezes num grau menor, outras até mais do que eram inicialmente. Cirurgia de fibrotomia supracrestal parece ser benéfico para manter a correção ou diminuir o grau da recindiva. Sobrecorrigir  a giroversão não parece ser uma boa opção. Surpreendentemente, cerca de 20% dos casos sobrecorrigidos permanecem na posição da sobrecorreção, não retornando à posição inicial.  A posição inicial de um dente com giroversão é a nossa melhor previsão para a sua posição no futuro, mas as excessões são tão numerosas que não podemos assumir esta afirmação.
Implicações clínicas: Aja com segurança: seja pessimista. Considere que a posição e giroversão de todos os incisivos inferiores irão recindivar durante ou após a contenção, independente da sua posição inicial. Cole todos os dentes à contenção fixa inferior, deixa-a permanentemente e realize cirurgia de fibrotomia nos dentes que inicialmente apresentarem giroversão.

Lição 6: A recindiva para lingual ou para vestibular é imprevisível.

Os dentes posicionados por vestibular ou labial frequentemente permanecem estáveis após o tratamento, enquanto aqueles posicionados por lingual são propensos à recindiva. Dentes anteriores em posição normal podem se mover para lingual ou palatino inesperadamente. Mesmo durante contenções fixas, alguns dentes anteriores mandibulares movem-se para vestibular afastando-se da contenção fixa que está por lingual. Alguns ortodontistas não gostam de colar os incisivos na contenção por razões periodontais e de higiene. Mas se todos os dentes não estiverem colados à contenção  existe a possibilidade ocorrerem movimentações.
Implicação clínica: Cole todos os incisivos inferiores à contenção.

Lição 7: Contenção permanente = segurança permanente


A contenção prorroga a inevitável tendencia de recindiva. O tratamento, incluindo a contenção, interrompe a natureza, mas não muda a tendência fisiológica de constrição do arco. A contenção parece bloquear temporariamente a recindiva. Quando a contenção é removida, os dentes são lançados a mudar nas mais variadas formas e graus.
Casos em que a contenção madibular fixa ficou tempos maiores, demonstram uma rápida recindiva inicial logo após a sua remoção. Não apresentam os usuais anos iniciais de estabilidade. Uma década ou mais depois, estes casos de contenção por mais tempo tem o mesmo nível de recindiva dos casos que ficaram apenas com um ou dois anos com contenção.
Implicações clínicas: A estabilidade anterior mandibular é uma ocorrência rara. A contenção fixa permanente é ó único meio de obter estabilidade a longo prazo.

Lição 8:  A extração dos terceiros molares não é necessariamente a escolha apropriada.

O clínico não deve se sentir mais otimista em relação à estabilidade apenas por que os terceiros molares foram extraídos ou estão congenitamente ausentes. A média de alinhamento pós-contenção entre os casos com terceiros molares presentes e os casos em que estão ausentes é a mesma. A remoção dos terceiros molares pode ser indicada por razões periodontais ou por impactação, mas não para se obter estabilidade.
A porcentagem dos casos estáveis e instáveis é a mesma nos casos em que os terceiros molares estavam presentes, nos ausentes, nos impactados e nos erupcionados.
Implicações clínicas: Mantenha a contenção fixa permanente, indepente da presença ou não dos terceiros molares.

Lição 9: Mais jovem não é necessariamente melhor.

Realizar todo o tratamento durante o início da adolescência não traz mais ou menos estabilidade do que fazê-lo no final da adolescência ou em adultos jovens. Infelizmente casos de extração seriada.
Acreditava-se que as extraçòes seriadas fossem mais estáveis. Infelizmente, casos de extração seriada recindivam da mesma forma dos casos tratados na dentição permanente. Similarmente, acreditou-se que tratar adultos fosse melhor por causa da eliminação do crescimento como um fator de risco, mas os resultados não mostraram ser melhores ou piores em pacientes jovens.
Implicações clínicas: A estabilidade não deve ser utilizada como razão para se iniciar um tratamento ortodôntico completo.

Lição 10: Há boas notícias!

Os dentes anteriores superiores normalmente são mais estáveis que os inferiores. Normalmente comportam-se melhor, independentemente de haver ou não recindiva no arco inferior. Mesmo nos casos em que a mordida aberta anterior recindiva, o alinhamento dos dentes superiores é melhor que no arco inferior.
Implicações clínicas: Na maioria dos casos o uso da contenção superior pode ser removida após alguns anos. Mas, tenha em mente que a contenção fixa inferior deve ser colocada permanentemente.

Lição 11: Desenvolvimento do arco é o tratamento mais arriscado em se tratando de estabilidade.

Se um caso de apinhamento for tratado com desenvolvimento do arco ( aumento do comprimento e inclinação dos incisivos) o resultado será uma significante recindiva após o período de contenção. Desenvolvimento do arco em casos de dentição mista produziu as recindivas mais severas, independente da forma do tratamento. O autor se lembrou de Charlie Tweed que retratou diversos casos de recindiva sem custos adicionais para o paciente que foram tratados com desenvolvimento do arco. Infelizmente, não há dados adicionais deste pacientes que foram retratados com extrações de prémolares. Tweed reconheceu que tratamentos com extrações em casos apinhados pode ser mais estável.
Outro problema do desenvolvimento dos arcos é a inclinação dos incisivos além das normas cefalométricas. Não é apenas uma questão estética ou de estabilidade, mas isto pode dificultar os nossos esforços em conseguir uma oclusão apropriada.
Outra preocupação, e na opinião do autor a mais importante, é o potencial de repercursões periodontais em resposta à inclinação dos dentes para vestibular ou o próprio movimento de corpo dos dentes com a intenção de ganhar espaço no arco. Evidências mostram que a possibilidade de haver deiscências das raízes aumenta à medida que as contenções são mantidas por lingual.
Implicações clínicas: Teremos vários dilemas em tratamentos com desenvolvimento dos arcos: Não podemos obter estabilidade. Deveremos usar contenção permanente. A contenção permanente da posição alargada do arco pode causar problemas iatrogênicos tais como recessão gengival ou deiscências.

Lição 12: Mantenha - não mude - a forma dos arcos.

A forma do arco tipicamente retorna ao seu padrão original. Em geral, grandes mudanças na forma do arco produzem grandes recindivas, enquanto pequenas mudanças recindivas menores. Mas há variações consideráveis. Usar uma forma preconcebida do arco parece menos apropriado que usar a forma original do arco do paciente. É interessante observar que a recindiva parecer ser maior no arco inferior. Um arco não necessariamente segue a tendência de recindiva do outro.
Implicações clínicas: Trate o paciente mantendo a forma inicial do arco mandibular.
OBSERVAÇÕES: MAS NESTE CASO, NÃO SERIA IMPORTANTE CONSIDERAR UMA ALTERAÇÃO DA FORMA DO ARCO CAUSADA PELA MALOCLUSÃO? UMA EXTRAÇÃO PRECOCE, UMA MORDIDA CRUZADA, UM HÁBITO DE SUCÇÃO?

Lição 13: O arco maxilar é mais propenso à expansão que o arco mandibular.

A expansão maxilar, rápida ou lenta, tem um histórico de sucesso. O mesmo não se aplica ao arco mandibular. Um arco mandibular que foi expandido para acompanhar a expansão de um arco maxilar tipicamente recindiva e não necessariamente é estabilizado pela oclusão. Como num tratamento com o aparelho de Frankel, a remoção temporária das forças musculares vestibulares resulta na expansão do arco, mas o resultado será estável? Infelizmente o autor não tinha nas suas amostras casos tratados com este aparelho.
Implicações clínicas: Não conte com a oclusão para estabilizar a expansão do arco inferior.

Lição 14: A estabilidade do alinhamento é aumentada

quando se mantém o Leeway space.


A manutenção do espaço de Nance inferior para dissolver apinhamentos sem a expansão do arco ou extração de prémolares parece ser bem sucessida em se tratando de estabilidade pós contenção. Nance sugeriu usar um arco lingual passivo durante a transição da dentadura mista para a permanente com o objetivo de “capturar” o excesso do espaço para alinhamento dos dentes anteriores. O autor cita um estudo que apontou mais de 70% de estabilidade deste tipo de tratamento. Em contraste, o autor encontrou mais de 90% de recindiva quando o tratamento envolveu desenvolvimento do arco além do espaço livre de Nance.
Implicações clínicas: Mantenha o espaço livre de Nance para alinhamento dos incisivos inferiores.

Lição 15: O crescimento facial não tem utilidade na correção de apinhamentos.


Não existe crescimento intra-arco, apenas constrição -  primeira na transição de dentadura mista para permanente e depois quando o arco sofre a constrição fisiológica com a idade. Como não ocorre aumento do arco antes ou durante o período de crescimento devemos trabalhar com esta limitação. O crescimento pode ser favorável em casos de cl II ou desfavorárel em pacientes cl III, mas nem a sua presença ou ausência parece ser benéfico em termos de aumento na estabilidade do alinhamento pós-contenção.
Por outro lado os registros de longo prazo demonstraram que o crescimento pós-tratamento pode estar relacionado como fator de risco para recindiva. Por exemplo, comparando casos com o mínino ou nenhuma recindiva com aqueles com maior recindiva, casos extremos – machos que cresceram até os 20 anos  demonstraram maiores índices de recindiva em relação às fêmeas que não apresentaram crescimento até estes anos.
Implicações clínicas: Não considere o crescimento como auxiliar no alinhamento e nem para aumentar a estabilidade da correção.

 

Lição 16: Ao invés de recindiva, “retorno à fisiologia normal” parece ser uma descrição mais correta ao processo que ocorre após a contenção.


A redução da largura e do comprimento do arco ocorre em casos tratados e não tratados tanto na adolescência quanto na idade adulta. Este é um processo fisiológico. Prevenir esta mudança normal do arco com aparelhos ortodônticos apenas adia o processo fisiológico. Enlargecer o arco inferior durante o tratamento torna o caso mais propenso a uma recindiva maior e mais rápida.
Implicações clínicas: A contenção bloqueia a constrição normal do arco inferior. Remover a contenção libera este bloqueio e permite a fisiologia normal acontecer o que recebe errôneamente o nome de “recindiva”.

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