Neal D. Kravitz; Budi Kusnoto; Peter T. Tsay; William F. Hohlt
A perda do primeiro molar inferior frequentemente resulta na extrusão do primeiro molar superior, resultando em intereferência oclusal, distúrbios funcionais, problemas periodontais e aumento na complexidade da restauração do espaço edêntulo.
Antes da possiblidade de aplicação dos microparafusos para a intrusão de molares, o nivelamento do plano oclusal maxilar frequentemente envolvia desgastes oclusais invasivos com tratamentos endodônticos, impactação cirúrgica ou tratamento ortodônticos complexos com o uso de arcos extrabucais ou aparelhos fixos montados em toda a arcada.
Mesmo com o aumento dos tratamentos ortodônticos em adultos, muitos deles se preocupam com a visibilidade dos braquetes convencionais, principalmente no arco superior. O ortodontista frequentemente encontra-se com o desafio de corrigir um problema oclusal enquanto lida com a exigência estética do paciente e a exigência da duração do tempo de tratamento com o dentista que o enviou este paciente, sendo que nenhum deles reconhece a extensão da dificuldade do tratamento.
Neste relato de caso, um procedimento minimamente invasivo e que não requer cooperação do paciente usando dois microparafusos foi usado para intrusão de um molar superior num paciente com ansiedade e erosão dental causado por refluxo gástrico.
Apresentação do caso
Uma paciente de 44 anos de idade foi encaminhada pelo departamento de prótese da Universidade de Illinois em Chicago para verticalização dos segundo e terceiros molares inferiores direitos e abrir espaço para um implante no local do primeiro molar. A história dental pregressa incluiu erosão dental genelarizada dos dentes maxilares, desgaste incisal, bruxismo, e extração do primeiro molar inferior direito por causa de cárie. A perda do primeiro molar resultou em inclinação para mesial dos segundo terceiros molares assim como extrusão do primeiro molar superior. Havia na história médica pregressa relato de ansiedade e refluxo gástrico há bastante tempo.
No momento do encaminhamento foi planejado para a paciente um tratamento protético com coroas totais em todos os dentes desde o primeiro molar superior direito até o segundo pré do lado oposto, com tratamento endodôntico iatrogênico do primeiro molar superior direito extruído e implante no local do primeiro molar inferior direito.
Diagnóstico e etiologia
O paciente apresentava relação esquelética de cl I e biprotrusão dentoalveolar. Apresentava boa intercuspidação dos dentes posteriores, trespasse vertical de 60%, 3mm de trespasse horizontal, erosão generalizada das faces oclusais e palatinas dos dentes maxilares.
GERD( gastroesophogeal reflux disease), refluxo gástrico e refluxo ácido
GERD, ou refluxo gástrico é uma condição em que o ácido peptídico ou a bile é regurgitada de volta dentro do esôfago e no espaço extraesofágico. O ácido pode danificar as paredes do esôfago resultando em úlceras, constrições( resultantes das cicatrizes), Barrett's esophagos ( mudança no alinhamento das células ?) e adenocarcinoma, assim como complicações extraesofágicas tais como dor no peito, asma, tosse crônica, laringite posterior e erosões dentais na superficie palatina dos dentes maxilares.
GERD pode ocorrer na infância e acomete aproximadamente 20% dos adultos americanos semanalmente e 36% pelo menos uma vez ao mês. O manejo ortodôntico inclui um encaminhamento para o médico como exame de rotina, avaliação para ver se tem bruxismo, atrição excessiva, vômitos, asma, apnea obstrutiva do sono, dieta, posição semi-supino durante o atendimento ( não deitar muito o paciente). Pacientes ortodônticos com GERD podem apresentar sialorréia ( salivação excessiva), resposta de proteção contra os ácidos do estômago, e pode ser instruído a mascar uma goma sem açucar (não hortelã) para manter o fluxo de saliva alto.
Objetivos do tratamento
Foi apresentado inicialmente um plano de tratamento completo com aparelhos fixos nos arcos superior e inferior. A paciente demonstrou ansiedade excessiva sobre usar aparelho completo no arco superior com receio de que os dentes pudessem "quebrar". Ela concordou com um plano de tratamento modificado de dois microparafusos no lugar do aparelho completo no arco superior para intruir o molar superior e eliminar a necessidade do tratamento endodôntico iatrogênico e coroa total neste dente. Aparelho completo no arco inferior para alinhar, nivelar e verticalizar os dentes posteriores e abrir a dimensão vertical (abrir a mordida). No final do tratamento, a paciente retornaria para a prótese para as coroas totais dos dentes superiores.
Progressão da intrusão do molar
Dois microparafusos ortodônticos de 1.4mm de diâmentro e 8mm de comprimento foram colocados no osso alveolar por vestibular distal ao 16 e palatino mesial a este dente. Os dois microparafusos foram colocados utilizando apenas anestésicos tópicos. Receberam carga imediata de 100g usando corrente elástica.
Para evitar que o elástico escapasse da superfície oclusal do molar ele foi retorcido e feito um aumento com resina na cúspide mésio-lingual do dente. Para prevenir que ele escapasse das cabeças dos microparafusos, o-rings elásticos foram colocados sobre elas. O elástico corrente foi cortado deixando-se livre um elo, que poderia ser puxado para reativar a intrusão na próxima consulta que seria 2 semanas depois.
Depois de 2 meses de força intrusiva, com modestos sinais de mudança, um elástico separador foi colocado entre o primeiro e segundo molar e o elástico corrente foi substituído por uma mola fechada NiTi ( 150g). A mudança pela mola NiTi proprocionou uma força mais constante, aumentando o tempo entre as consultas. No quarto mês ( 2 meses de uso da mola), foi observada intrusão clinicamente visivel e o separador foi removido. A paciente faltou no quinto mês de tratamento. No sexto mês, a paciente apresentou-se agora com o molar de 1 a 2mm acima do plano oclusal. Os microparafusos foram removidos e as moldagens de ambas arcadas foram feitas.
A paciente recusou-se a usar contenções fixas em qualquer arcada, assim como conteção removível no arco superior. A contenção foi feita com placa de Hawley no arco inferior com um bloco de resina no lugar do molar que foi perdido. A paciente concordou em colar 3 braquetes e um arco segmentado para ajudar a extruir novamente o molar superior e trazê-lo para um melhor alinhamento no arco. Ansiosa por medo de achar que os seus dentes pudessem "quebrar" retornou depois de apenas 3 semanas e solicitou a remoção do aparelho.
Resultados
Após 6 meses e 3 semanas o tratamento foi finalizado. Uma oclusão funcional foi estabelecida no lado direito através da intrusão do molar e verticalização dos segundo e terceiros molares inferiores criando espaço adequado para a colocação do implante na região do primeiro molar. O primeiro molar superior foi intruido para dentro do seio maxilar com uso de microparafusos. Esta intrusão ocorreu mais rapidamente depois da colocação de um elástico separador entre o primeiro e segundo molar e o uso de uma mola fechada Niti de 150g. Uma placa de Hawley inferior manteve o espaço na região do molar inferior e o alinhamento e permitiu que o molar superior que intruiu demais a assentar novamente na sua posição ideal no plano oclusal.
A sobreposição cefalométrica revelou que a intrusão do molar foi de 4.4mm. Uma radiografia panorâmica digital mostrou uma lâmina dura intacta ao redor do molar no seio maxilar com nenhuma reabsorção radicular radiográficamente visível.
Discussão
O microparafuso do palato foi colocado na mesial do primeiro molar para evitar o foramen palatino maior e osso poroso presente na região posterior da maxila.
O local ideal para a colocação de um microparafuso no palato é na sutura palatina mediana ou na região paramediana. Para permitir uma força igual tanto na palatina quanto na vestibular, é necessário um braço de extensão por palatino.
Antes da aplicação de forças intrusivas é necessário a colocação de um elástico separador entre o dente extruído e seu adjascente. Em particular, a mesial do dente posterior frequentemente está contra superfície distal do dente extruído abaixo do seu contorno final. Este efeito de "canto de porta" impede a intrusão. Enquanto estiver usando o elástico separador pode acontecer dele escapar para o espaço subgengival resultando num dano periodontal. Deve-se remover o elástico assim que a intrusão for clinicamente evidente.
Observe no desenho acima que a distal do primeiro
molar(parte côncava) repousa sobre a mesial do
segundo molar ( parte convexa). Isto faz com que
o segundo molar trave a intrusão do primeiro.
Se o molar pode ser intruído para dentro do seio maxilar sem reabsoção apical da raíz é controverso.
Quanto a recindiva, Sugawara et al relatam uma média de 30% para os primeiros e segundos molares inferiores.
Conclusões
Um molar extruído pode ser intruído em direção à cortical do seio maxilar usando microparafusos.
Intrusão de molar a curto prazo pode ser conseguida sem reabsorção radicular clínicamente visível.
Através do uso de microparafusos e um curto período de tempo com aparelhos fixos parciais para corrigir um problema oclusal localizado, a ansiedade dental da paciente foi reduzida, o gastos com o tratamento restaurador foi reduzido e o emalte dental e vitalidade foram preservados.
Comentários
A intenção de colocar este artigo não foi apenas para demonstrar a intrusão do molar. Vejam vocês que neste texto há mais informações que na minha opinião são tão valiosas quanto o assunto principal.
Tratou-se uma paciente com refluxo gástrico, que tinha nos seus dentes maxilares efeitos deste refluxo. Era uma paciente adulta extremamente ansiosa, que dificultou o tratamento e inclusive impediu que fosse feito da maneira correta.
Esses pacientes, meus amigos, estão no nosso dia a dia e é fundamental sabermos como lidar com estas situações. Estes problemas não estão em nenhum livro, vão além da técnica. Entram no campo do relacionamento interpessoal. Todos passamos por isso.
Outra informação importante foi o efeito "canto de porta" que pode acontecer quando tentamos intruir um primeiro molar superior. A mesial do segundo molar pode atuar como impecílio a esta intrusão. Nestes casos convém usar um elástico separador entre estes dois dentes. No artigo acima o elástico ficou por 2 meses. Num caso como esse ele pode até ficar tanto tempo, mas nas consultas o profissional deve remover o velho, passar um fio dental no espaço para higienizar e usar um separador novo.
Uma situação parecida com essa é quando um dente está mais para vestibular ou palatino em relação ao vizinho ( geralmente prémolares), pode-se usar elásticos separadores para facilitar o movimento.
O artigo original pode ser encontrado aqui
2 comentários:
Ao colega Dr Ricardo Nadar meus parabêns por um artigo tão esclarecedor,estou com um caso muito parecido no consultório mas não tenho experiência com intrusão de molares,estou trabalhando com orto há 2 anos e vai ser meu primeiro caso de intrusão com mini implantes,adorei o seu método,simples e eficiente.Obrigada.
Fabiana Chaves
Olá Fabiana, participe sempre. Nos contes as suas experiências. Estaremos sempre aprendendo!
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