Jorge Faber and Flávia Velasque
Este artigo está edição de outubro da AJODO, além da qualidade técnica tem uma apresentação impecável com fotografias muito bem feitas. Aliás, os artigos de brasileiros publicados nesta revista são quase sempre os que mais gosto.
Introdução
As causas da hipodontia, a anormalidade mais frequente da cavidade bucal, ainda são parcialmente conhecidas. Embora possa ocorrer em qualquer dente, a hipodontia dos segundos prémolares, que afeta a oclusão posterior, merece especial atenção por que ela representa de 60% a 70% das agenesias quando se exclui os terceiros molares. As anomalias subsequentes necessitam de tratamento ortodôntico e para isso existem várias abordagens. A decisão de qual será a abordagem não é fácil.
Uma opção de tratamento é a manutenção do espaço e posterior colocação de uma prótese. Esta decisão pode não ter vantagem se pensarmos a longo prazo. Por isso muitos ortodontistas fazem a opção de fechar os espaços dos dentes ausentes quando possível.
Se a escolha for de fechar os espaços, esta decisão torna-se relativamente fácil quando, por exemplo, quatro segundos prés estão ausentes num paciente cl I com perfil convexo. Por outro lado, quando o perfil é reto ou côncavo, ou os dentes ausentes não são simétricos, o convencional fechamento do espaço pode ser contra-indicado e outro dente deve ser extraído para fazer o tratamento possível.
Este relato descreve o tratamento de uma mulher com ausência congênita dos dentes 15, 47 e 48. Uma miniplaca de titânio foi usada para fechar o espaço de um segundo prémolar através da mesialização do molar.
Diagnóstico e etiologia
Uma mulher de 24 anos e 7 meses de idade queixava-se da mobilidade do dente 55, já sabendo que o dente 15 estava ausente. A análise facial mostrou que a sua face era simétrica e o perfil côncavo.
Os exames clínico e de modelos mostraram uma maloclusão de cl I de Angle associada a diastemas em ambas arcadas. As linhas medianas dentais coincidiam entre si e com a face. O dente 55 apresentava mobilidade grau 3 e o seu diâmetri mesiodistal era de 9mm. Os dentes 47 e 48 estavam ausentes. O dente 17 estava extruído. Os dentes 12, 22 e 18 apresentavam microdontia. A higiene oral era excelente.
Fotomontagem panorâmica do início do tratameno, a seta aponta o segundo molar decíduo.
Objetivos do tratamento
Os maiores problemas eram os dentes ausentes assimetricamente, a discrepância de Bolton por causa da microdontia, diastemas anteriores generalizados e o perfil côncavo. Os objetivos do tratamento foram fechar os diastemas e obter adequada oclusão posterior no lado direito sem afetar severamente o perfil ou mudar as linhas medianas.
Alternativas de tratamento
Todas as alternativas apresentadas para a paciente incluíam e manutenção de uma parte dos diastemas mandibular e maxilar. As seguintes alternativas foram discutidas:
1.Tratamento ortodôntico associado a implantes para repor os dentes 15 e 47. A maior desvantagem desta abordagem foi a necessidade de se fazer as próteses implanto-suportadas e a dificuldade de se colocar um implante na região do 47 por causa da pequena altura do osso da região.
2. Tratamento ortodôntico com extração dos dentes 25 e 35 e um implante na região do 47 para ser usado como ancoragem para distalização dos dentes neste segmento. As desvantagens foram a dificuldade de colocação do implante e principalmente os efeitos deletérios no perfil que poderia se tornar mais côncavo.
3. Tratamento ortodôntico com uma miniplaca de titânio para ancoragem e mesialização dos molares para o espaço do 15. A desvantagem desta opção é que seriam necessárias duas cirurgias: uma para colocação da miniplaca e extração do 55 e outra para a remoção da miniplaca.
Sequência do tratamento
A paciente e o seu ortodontista optaram pelo uso da miniplaca. Com este propósito foram montados os aparelhos fixos em ambas arcadas.
Os dentes foram alinhados e nivelados e o elemente 55 foi extraído no momento em que foi inserido o arco retangular 0.017x0.025. No mesmo momento da extração do 55 foi colocada a miniplaca.
A miniplaca foi posicionada de forma que o anel mais inferior ficou a 5mm do arco ortodôntico e foi fixada com dois microparafusos logo abaixo da abertura piriforme. O anel mais inferior foi cortado para que ficasse como um gancho. Durante todo o processo de mesialização não foi observada nenhuma mobilidade da miniplaca e a higiene da paciente foi excelente.
No final da cirurgia um "power chain" foi colocado da miniplaca para o dente 16. Duas semanas depois outro "power chain" foi colocado da miniplaca para um gancho encaixado no tubo. O dente 16 foi movido 7.4mm mesialmente até que o ponto de contato com o pré foi detectado clinicamente. Os dentes 17 e 18 moveram-se para mesial espontâneamente durante o tratamento.
Miniplaca após a cirurgia com o elástico colocado diretamente no 16.
Duas semanas após a cirurgia foi instalado o gancho no tubo do molar.
O fechamento do espaço resultou numa papila fissurada entre os dentes 16 e 14. Esta papila fissurada tinha um formato atípico em forma de "C". Ela foi cirurgicamente removida e a mucosa palatina foi gradualmente se tornando normal.
Os diastemas maxilares e mandibulares foram fechados com alastics longos presos a todos os braquetes. Contudo, pequenos diastemas foram mantidos nas mesiais e distais dos dentes 12 e 22 para que estes pudessem ter as suas formas restauradas com resina posteriormente.
Elásticos de cl II foram usados por dois meses no lado direito na parte final do tratamento.
O tratamento ativo durou 34 meses. Depois de remover o aparelho a miniplaca foi removida e nesta mesma sessão o dente 18 foi extraído.
Especial atenção foi dada a contenção. No arco superior foi usada uma contenção circumferencial e um segmento de fio braided 0.020 colado nos dentes 14 e 16. No arco mandibular foi colado um 3x3 de canino a canino e braided 0.020 nos caninos e primeiros prés.
Resultados
Bons resultados estéticos e dentais foram obtidos. O espaço do dente 15 foi fechado com movimento mesial de 7.4mm dos molares. Um relação de cl II foi estabelecida, com o dente 17 ocluindo com o molar inferior. Nenhuma reabsoção radicular foi observada nos molares que mesializaram quando comparados com os molares do outro lado e o movimento mesial não alterou a relação das linhas medianas.
Os diastemas da região anterior foram fechados através de retração dos incisivos e isto alterou levemente o perfil que já era côncavo no início do tratamento. O fechamento do espaço do 15 formou uma papila fissurada que acumulava biofilme, para higine desta região a paciente passava o fio dental dentro da fissura.
Discussão
O tratamento mais comum para dentes ausentes é a reabilitação com implantes. Nesta paciente esta opção poderia ser mais simples. O tempo total de tratamento mais curto com bons resultados estéticos pelo menos em curto prazo. Contudo, optamos por fechar os espaços e evitar usar próteses implanto-suportadas.
A prótese implanto-suportada é uma excelente alternativa restauradora e tem uma taxa de sucesso de 90% em cinco anos de acompanhamento de 85% com 10 anos de acompanhamento. Contudo, um dente natural atua melhor. Adicionalmente, alguns estudos mostram que os implantes têm excelentes resultados estéticos e funcionais no momento da sua colocação que tendem a deteriorar com o tempo.
Se o espaço do 15 fosse mantido e reabilidato com implante, o dente 47 também deveria ser reabilidado e a colocação do implante nesta área seria dificultada pela proximidade do canal mandibular.
Uma das limitações da opção de tratamento escolhida para esta paciente foi a necessidade de realização de duas cirurgias ( colocação e remoção da miniplaca), mas se fossem colocados os implantes seriam duas cirurgias também.
Um sistema de ancoragem alternativo para o movimento mesial dos molares poderia ser o uso de mini-implantes ao invés de mini-placas. Ambos sistemas têm prós e contras. Contudo, as vantagens das miniplacas são a sua grande estabilidade e possibilidade de fixar os parafusos além do nível das raízes independente da presença ou não de espaço entre as raízes. Além disso, a posição vertical da miniplaca pode ser ajustada para ficar mais próxima do centro de resistência do molar e isto facilita o movimento de translação do dente. Este padrão de movimento foi observado nesta paciente, não houve grande inclinação do molar.
O segundo molar moveu-se mesialmente sem nenhuma força ortodôntica ser aplicada diretamente nele. Ele provavelmete moveu-se espontâneamente como resultado da tração das fibras transeptais presas a este dente.
Conclusões
Nós obtivemos bons resultados e nossa abordagem utilizou apenas um mini-implante temporário, a mini-placa, ao invés de 2 implantes.
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